*Um texto antigo que foi dedicado ao amigo (sumido!) Fábio Ulanin.
Pensava que talvez a proximidade do Carnaval fosse a causa da aridez de temas novos, até que folheando um velho livro do inglês Gilbert Keith Chesterton, uma frase sublinhada na página se ofereceu como a fruta madura da mangueira vizinha: “a seriedade emana dos homens naturalmente, enquanto o riso é como um salto.”
Dia desses, numa manhã em que encontrei a adequada mistura de sonatas e cafeína, anotara um novo aforismo: “rir demais de tudo é como afogar-se em açúcar de confeiteiro”.
O riso pode advir do dia-a-dia, sim, sem que nenhum autor o provoque, mas o comum é que seja fruto da provocação simples ou profissional de um agente: o humorista. Usando o senso lúdico, este alcança o que o normal dos homens não encontrou como equilíbrio do riso – o salto, a pirueta, por vezes atingindo a graça de um riso rarissímo – uma espécie de “duplo twist carpado” do humor.
Em outra medida, pode-se pensar como Gustavo Corção para quem o humorismo seria “uma espécie de poesia dos canhotos”. Aceita a classificação dos humoristas em poetas do riso restringe-se o grupo destes a um conjunto bem pequeno, enquanto em quantidade pululam, mesmo, o dos humoristas profissionais que mais pendem para aquele riso que sufoca como o dito açúcar de confeiteiro.
O restrito conjunto dos que fazem humor mais próximo da poesia incluíria Chesterton, Machado, Dickens, Millôr, entre outros que o leitor achará em sua memória afetiva do melhor riso. Mas há os que, ao contrário desses, praticam aquele outro tipo de humor que, conforme Gabriele Bretzke, “incita ao deboche ou à zombaria sarcástica”, associados, por exemplo, a temas políticos e meramente eróticos. O que concorda com uma observação de Gustavo Corção:
“Entendendo por humorismo, quanto à forma, o que fizeram Chesterton, Machado e Dickens, reconheceremos que o engraçado, o cômico, a palhaçada, a anedota, pelo que têm de excessivo, desatado e enfático, parecem-se mais com os discursos políticos do que com a obra daqueles três autores.”
A professora Gabriele que, recentemente comentando o best-seller de C.S.Lewis, “Screwtape Letters” (1) – as famosas 31 cartas de um diabo a seu sobrinho – ressaltou que “C.S. Lewis – com insuperável sutileza – mostra o caráter problemático que há no humor que se alimenta de zombaria e escárnio e não da verdadeira e desinteressada alegria”. Há nessa espécie de humor um senso de proporção, uma espécie de equilíbrio poético e de economia narrativa”.
Aprende-se com C.S. Lewis que o lugar do riso não é o mesmo do esgar, do trejeito, da careta medonha que se opõe à alegria desinteressada. Só a geografia do riso é a mesma: a boca do que sorri. Mas a alma do que sorri, separa bem aquela lama do esgar do límpido riso desinteressado e puro. Esses distam entre si com o mesmo e extenso vale que separa a gargalhada macabra do sorriso da criança. O riso da criança, este sim mais próximo do poeta e do humor, é leve como uma gag de Monsieur Hulot, na criação fílmica de Jacques Tati.
E já que aprendemos com Chesterton e C.S.Lewis que “a seriedade demasiada não é uma virtude”, tentemos o salto, praticando o riso sadio, certo de que este não é o texto mais convincente para convencê-lo ao salto. Confessa o cronista não ter nem de longe o senso de humor de GKC, que concluiu: “é mais fácil escrever um editorial para o Times do que uma boa piada para o Punch”; o que, transposto para nossos dias, seria como comparar um editorial para “O Globo” a uma anedota para os bons humoristas de plantão (o que, definitivamente, não sou nem candidato!).
Sempre gostei muito do humor, sempre fui muito inclinado a esse gênero artístico; e sempre que posso tento imprimi-lo em meus textos.
Justa apologia.
Quanto ao Fabio, encontrei-o dia desses na Livraria Cultura. Mas interneticamente, parece, que ele não mais se manifesta. Uma pena.
Abraços,
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Monsieur Della Santina.
Obrigado pela visita e pelas notícias do nosso amigo Fabio.
É uma pena que jovens talentosos assim abandonem os blogs… enquanto reina grande mediocridade na blogsphere.
Amitiés,
Beto.
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Sim, meu caro, é uma pena que o Fabio tenha abandonado a blogosfera. Ele estava publicando algo no Multiply. Mas não sei como está agora. Não tenho visto mais nada dele.
Abraços,
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Republicou isso em Leveza & Esperançae comentado:
Porque “o humor é centelha divina” (Kundera, via Rodrigo Gurgel), republico este post.
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