UM CAFÉ VIRTUAL pressupõe uma entrevista virtual. Desde que o ficcionista Carlos Jordão me encantou com seu “Príncipe Letícia” que tento marcar um café com o Autor. Já estive bem próximo de um amigo dele, do mesmo time de primeira dos publicitários-escritores de Goiás.
AGORA, deu que uma entrevista virtual funcionou.
No diapasão da estória lida, procurei sondar a alma e as rotinas do ficcionista (par mim, Poeta-ficcionista) de alto valor. Confira no bate-bola abaixo:
Entrevista ‘virtual’ para o grupo Literatura Goyaz – com Beto Queiroz, 23 SET 2015.
i. Tivesse que escrever um “guia da peregrinação sagrada”, qual o destino que escolheria?
R: De verdade, não tenho qualquer interesse em viajar. Amo Goiás, mas nem mesmo Pirenópolis eu conheço.
ii: Se voar fosse uma possibilidade humana, para onde voaria hoje?
R: Para alguns lugares do meu passado. Não por nostalgia. Para consertar algumas coisas.
iii. Perdas que machucam profundamente o autor, influenciam na sua (dele) ficção? Se sim, como é (foi) com você?
R: Sim. Expurgamos muitas de nossas perdas pela escrita. No meu caso, as perdas tornaram minha visão do mundo mais pessimista.
iv. Uma noite na história ficcional de Carlos Jordão se descreve como? (máx. 30′)
R: Se eu fosse escrever, sairiam coisas bem sinistras ou inexplicáveis.
Dois trechos de contos:
“Havia oito tipos de lobisomem. Alguns eram mansinhos. Tímidos. Pareciam vira-latas. Apenas três tipos seriam perigosos: Saco Preto, Rama e Pimenta. Depois de falar se benzeu. E daí mascou um pedaço de resina brava. Saímos em quatro turmas pelo meio do gado. Todo mundo a pé. Nossa presença trazia alguma calma”.
“Tentava dormir, mas não conseguia. Rolava de um lado para outro. Cansei daquilo e saí. Fui até o rio sob uma lua minguante. Minha mãe estava lá, em pé sob uma árvore. Parei junto dela. O rio era então uma ossada branca. Água mesmo tinha pouca”.
v. Passar da comunicação em 30 segundos para um calhamaço de 200 ou 300 páginas funde a cuca do ficcionista?
R: Para mim foi difícil. Só consegui depois de largar a publicidade. E mesmo assim precisei de 5 anos de trabalho diário. Saiu um livro horrível. Só depois disso consegui sair da cadeia e fazer algo mais prestável. Rsrs… (A publicidade, para mim, sempre foi uma cadeia). Ah, e não faria mais estórias de 200 páginas. Eu me expresso melhor correndo os 100 metros rasos. Sempre estórias curtinhas. Ainda influência da publicidade? Não sei.
vi. Publicidade ou ficção – ou ambas?
R: Publicidade, de jeito nenhum. Deus me livre. Fiz por injunção. Sempre amei a literatura, mas não tinha como me dedicar. Tentei por várias vezes conciliar os dois lados. Fracassei em todas. (O Antônio Torres conseguiu fazer bem as duas coisas).
vii. Um autor de ficção da infância (ou juventude) que você admite ter influenciado o seu estilo? E da idade madura?
R: Na infância fui muito influenciado pelas histórias de Conan Doyle. Sherlock Holmes é um ótimo começo. Depois veio o inevitável Monteiro Lobato. Minha dívida com ele é enorme. Também devo muito às histórias em quadrinhos. Lia até fotonovelas na infância, e tudo isso ecoa em meu trabalho.
Na juventude, Machado de Assis, José de Alencar, José Mauro de Vasconcelos, Jorge Luiz Borges e José j. Veiga.
Idade madura: continuam Machado de Assis e José J. Veiga, mais Stephen King, Raymond Carver e vários autores best-sellers. Gosto muito de Scott Turow.
viii. O “Príncipe Letícia” pode ser uma história a transformar-se numa história dos grandes estúdios? Vejo tanto movimento de alto padrão na história e dá-me tantas voltas no pensar… Como o público tem reagido ao livro e como reagiria a um desenho animado (ou filme)?
R: Já me falaram em desenho animado, mas não acho viável. Os grandes estúdios nunca olhariam para uma estorinha brasileira. E mais grave: Letícia é má e não vai ficar boazinha depois. Isso é inaceitável dentro do “pacote moral” de um grande estúdio. Sobre a resposta dos leitores, não tenho muitos subsídios. Vendi pouco e a maioria dos leitores não comenta. (Quem gostou, gostou muito).
ix. Jordão, o Ser incluído na história e nas estórias. Em síntese, tem uma mensagem ou uma bíblia própria.
R: Falo das minhas pulsões interiores. Nos meus quase mil contos, separados em 4 volumes(2 inéditos), repetem-se quase os mesmos problemas: o susto diante de um mundo incompreensível, a descrença na viabilidade do ser humano, e muitas outras dúvidas. Tem mesmo alguém no volante disso aqui? E se tem, ele tem carteira? Tudo isso eu só percebo bem depois. De forma consciente, nunca tentei passar qualquer mensagem. Não gosto de literatura moralizante.
x. Crenças o ajudaram a chegar aqui? Levam você ao futuro?
R: Nenhuma crença em especial. Só mesmo o vício de escrever. De resto, tenho muita perseverança e disciplina. Escrevo todos os dias, das 7 da manhã ao meio dia. Isso inclui sábados, domingos e feriados. Escrevo na manhã de Natal. Na manhã do Ano Novo. Nesses últimos 10 anos devo ter faltado à “aula” umas 15 vezes, se tanto, e nunca por minha vontade. Não é sacrifício, é bom. E além do mais, vou ter muito tempo para dormir, depois de morto.
xi. Uma coisa que teria incluído aqui e o entrevistador não o fez?
R: Tentei ser o mais sincero possível. No mais, só quero agradecer pela oportunidade. – Carlos Antônio Jordão.
O entrevistador é quem te agradece, caro Carlos Jordão.
Encontre o escritor Carlos Jordão em Google+ ou no excelente blog que o Autor mantém sob o título de Escuridão & Medos. Aos que desejam ler uma amostra dos contos de Carlos Jordão, há também esses “Três Contos em Jornal OpçãoCultural”.Pedidos de livros do Autor – Email para: carlosantoniojordao@gmail.com
Livro:Aventuras do príncipe Letícia
Editora: Kelps
Ilustração e capa: Jonas Medeiros
R$20,00+despesas de correio(+- R$5,00).
(AQ).
Pingback: Carlos Jordão (Entrevista) – da série “Café com Beto (1)” | Escuridão&Medos
Carlos achei maravilhosa sua entrevista. Pois eu acho que a pessoa quando tem que fazer uma coisa, nunca é incapaz. cre em Deus e cre em si mesmo!
CurtirCurtir