Esta viagem ao Japão despertou no cronista sua vocação para o Centro, a redescoberta da sua goianidade.

Goiano ao Extremo
Por Adalberto de Queiroz, especial para O POPULAR (Goiânia)


Eu e o Japão. O Japão e eu. Como pensar as vivências de Albert Camus com os Estados Unidos (e o Brasil) ou de Lafcadio Hearn com o país nipônico – tão desiguais? Há similaridades e desavenças.

Penso no meu Japão como uma descoberta de alguém que vive um geocentrismo latino (e brazuca) no século 21, à moda de um Albert Camus, franco-argelino, que se mostra, em seu Diário de viagem, um europeu cheio de preconceitos ao visitar o Brasil e até mesmo grosseiro com alguns de nossos intelectuais que o receberam como um rei.

Meu desejo ao planejar a viagem ao Extremo Oriente incluía conhecer o escritor japonês mais popular da atualidade (Haruki Murakami). Fiz algumas démarches, até constatar que era tarefa impossível. Ele só dá uma entrevista por ano ao jornal que o apoiou no início da carreira. Apesar de não ser meu escritor mais admirado na literatura japonesa, Murakami me agrada muito, em meio a tudo que li com entusiasmo desde abril do ano passado, quando soube que iria visitar meu genro, filha e neto em Tóquio. 

Há outros que me atraem mais pelo estilo e pela inventividade. Falarei deles em crônicas futuras. Por ora, trago Junichiro Tanizaki, de quem tomo de empréstimo uma frase de seu romance “As irmãs Makioka”, um grande painel do Japão pré-Guerra onde uma família é o centro da narrativa. Ali, num dado momento, em que há uma reunião típica de arranjo de casamento, um jovem é posto à prova sobre seu estágio em Paris. Ele que é o candidato à mão de uma moça de família tradicional japonesa ouve isso:

– Foi a Paris e descobriu o Japão… Nada mau, realmente. Suponho que esse foi também o motivo por que passou a preferir mulheres tipicamente japonesas.

Não estando em busca de casamento, o cronista admite que viajar para destinos exóticos nos coloca em sintonia com nossas origens. Sempre vou ao Exterior para descobrir o Brasil e, especialmente, Goiás como a joia da coroa dentro da Federação. Volto com um encanto novo por minha terra.

É uma lástima que ao voltar dessa viagem tenha descoberto tantas desavenças entre os meus compatriotas, mas, como a política me é desinteressante, deixo à conta das coisas perdidas e sigo em frente.

Não creio que tenha que seguir o conselho de alguns poucos de voltar para Tóquio e me reestabelecer em Ryoguku-Sumida, que é meu endereço predileto na capital japonesa. Tampouco, que deva pedir asilo na embaixada do Vietnam, que é povo que está próximo dos nipônicos e para onde poderia me voltar se as coisas aqui derivam para uma ditadura à la Nicarágua ou Venezuela. Entanto, creio sermos maiores que isso.

Em todos os momentos em que as emoções me elevavam ao estágio de quase irracionalidade ou ansiedade, eram os escritores brasileiros que me voltavam à mente no Japão. Alaor Barbosa, Carmo Bernardes e Gil Perini me voltaram em sonhos e lembranças pontuais diante dos episódios mais inusitados ao longo dos meus passeios por Machida ou Sumida, em Tóquio.

Os versos de alguns poetas da minha terra me vieram socorrer quando os sismos me assustavam a ponto de sentir-me paralisado na terra de Bashô. E eis que me vou com um poeta de minha terra (A. G. Ramos Jubé) pelo interior do Japão, de Tóquio a Quioto:

“…metido em alpercatas rompe-léguas,
eis que me vou na viagem maravilha.
Ah, paisagens de sol em céu aberto!
Eu, pássaro feliz, flauta andarilha”. 

Sim, eis o menino da Vila Jaiara – Anápolis, está rompendo léguas e cortando espaços entre os céus de Anápolis e do Extremo Oriente, sempre com o coração a pulsar num diapasão do centro que o chama a ser hoje e sempre brasileiro e goiano, caipira goiano e cosmopolita, que reivindica ser cidadão do mundo.

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