Arquivo da tag: Sébastien Lapaque
Ainda "Sob o Sol do Exílio" (II) : lições e correlações
NÃO SERVISSE O LIVRO DE SÉBASTIEN LAPAQUE para nada, já seria de enorme utilidade – como uma espécie de tapa-na-cara! –
utilidade ESTa DE alertar nossa intelectualidade sobre a importância dos escritores católicos franceses na inteligência do Brasil das décadas de 30 a 60 do século XX (esquecidos, como tantos outros, pela mídia).
CREIO ser o livro em epígrafe da maior importância por relembrar a grande mídia (e aos bem-pensantes do Brasil) que um dos mais importantes escritores católicos da França (e do mundo!) escreveu parte de sua literatura de combate e alguma ficção em Pirapora (onde pôs ponto final a um de seus mais importantes romances “Monsieur Ouine” – ver o 1o. post sobre o livro Sob o Sol do Exílio), Belo Horizonte ou Barbacena.
Relevante, pois, o papel que Bernanos e outros imigrantes da intelectualidade francesa tiveram para o Brasil na Academia e, principalmente (do meu ponto de vista, anti-acadêmico por natureza!), fora do ambiente universitário; pois bem, considerando tudo isso, o livro de Sébastien Lapaque presta um grande serviço ao leitor apaixonado pela literatura de Bernanos e interessado nas formas de resistência da inteligência rebelde – as emissões de rádio enviadas a BBC; os artigos para “La Marseillaise” (Londres e Alger) – órgão da Resistência Francesa; as afinidades eletivas de Bernanos e a admiração crítica (em alguns casos, muito crítica como a de Carpeaux); fraterna e apaixonada – como a Virgílio de Mello Franco e de Geraldo França de Lima); cristã e quase discipular – como a de Alceu Amoroso Lima.
Este livro de S. Lapaque, ora lançado pela É Realizações, ganha relevo maior por ser uma espécie de tapa na cara de nossa intelectualidade que, depois do livro de Humberto Sarrazin (obra da Vozes, 1968, e nunca reeditada!) relegou Bernanos a um silêncio sepulcral na Academia, sem jamais voltar a se debruçar sobre essa riqueza chamada Bernanos no Brasil. O grande urso em Barbacena precisou de um escritor francês que cruzasse o Atlântico para levantar-lhe do túmulo a que fora condenado pelos bem-pensantes de nossas Academias, e nos mostrasse o ouro que deixamos escondido em uma pequena cidade de Minas Gerais e em arquivos esparsos pelo país, fora a quase espartana casa pequenina da Cruz da Almas a que a memória dele dedicamos como mini-museu (e vez por outro abandonado, ao longo desses mais de 60 anos).
A história da inteligência no Brasil tem curtíssima memória – eis ao quê mais serve demonstrado na didática publicação de Lapaque – e a quem ficamos devedores para sempre…

Capa de “Bernanos no Brasil”, organizado por Humbert Sarrazin e nunca reeditado pela Vozes (original de 1968).

Originais de Bernanos, retirados da obra de Daniel Perezil, Cahiers de Monsieur Ouine.
Opesquisador da obra de Bernanos há-de se debruçar nos volumes antigos da Biblioteca Nacional para recuperar-lhe os artigos que duas vezes por semana
(diz-nos Lapaque na p.120 de “Sob o Sol…” edição francesa da Grasset) publicou o escritor francês, assim anunciado em “O Diário”, no dia 21 de maio de 1940 como “UN ANCIEN COMBATANT s’exprime sur l’offensive allemande” (Um ex-combatente [da I Guerra Mundial] fala sobre a ofensiva alemã n’O Diário):

Bernanos em foco com Lapaque (2003) e Sarrazin (1968) – a figura do mais brasileiro dos escritores católicos franceses ganha novas leituras
“L’écrivain français Georges Bernanos est à nouveau à Belo Horizonte, ayant pour destination Pirapora, où il réside, et d’où il reviendra peut-être bientôt, pour habiter une propriété rurale proche de Belo Horizonte”
(O escritor francês G.Bernanos está novamente em BH, em direção a Pirapora, onde reside e de onde deverá retornar em breve, para morar em uma propriedade rural perto de BH).

A casinha pequenina de Cruz das Almas guarda o que restou da memória de Bernanos no Brasil. Um pequeno recanto onde o escritor francês sonhou reproduzir um pedacinho da França no Brasil. Na sequência, um presente aos amantes da obra do “Grande Urso”, páginas esparsas de “Cahiers de M. Ouine”, de D.Pérezil
Reproduzo aqui um texto retirado do site da Academia Brasileira de Letras sobre a amizade de Virgílio e Afonso Arinos com o escritor GB na visão de Afonso Arinos Filho.
******Clique sobre o texto em destaque para acessar o arquivo em PDF: Bernanos_Virgilio_AfonsoArinos
Ainda “Sob o Sol do Exílio” (II) : lições e correlações
NÃO SERVISSE O LIVRO DE SÉBASTIEN LAPAQUE para nada, já seria de enorme utilidade – como uma espécie de tapa-na-cara! –
utilidade ESTa DE alertar nossa intelectualidade sobre a importância dos escritores católicos franceses na inteligência do Brasil das décadas de 30 a 60 do século XX (esquecidos, como tantos outros, pela mídia).
CREIO ser o livro em epígrafe da maior importância por relembrar a grande mídia (e aos bem-pensantes do Brasil) que um dos mais importantes escritores católicos da França (e do mundo!) escreveu parte de sua literatura de combate e alguma ficção em Pirapora (onde pôs ponto final a um de seus mais importantes romances “Monsieur Ouine” – ver o 1o. post sobre o livro Sob o Sol do Exílio), Belo Horizonte ou Barbacena.
Relevante, pois, o papel que Bernanos e outros imigrantes da intelectualidade francesa tiveram para o Brasil na Academia e, principalmente (do meu ponto de vista, anti-acadêmico por natureza!), fora do ambiente universitário; pois bem, considerando tudo isso, o livro de Sébastien Lapaque presta um grande serviço ao leitor apaixonado pela literatura de Bernanos e interessado nas formas de resistência da inteligência rebelde – as emissões de rádio enviadas a BBC; os artigos para “La Marseillaise” (Londres e Alger) – órgão da Resistência Francesa; as afinidades eletivas de Bernanos e a admiração crítica (em alguns casos, muito crítica como a de Carpeaux); fraterna e apaixonada – como a Virgílio de Mello Franco e de Geraldo França de Lima); cristã e quase discipular – como a de Alceu Amoroso Lima.
Este livro de S. Lapaque, ora lançado pela É Realizações, ganha relevo maior por ser uma espécie de tapa na cara de nossa intelectualidade que, depois do livro de Humberto Sarrazin (obra da Vozes, 1968, e nunca reeditada!) relegou Bernanos a um silêncio sepulcral na Academia, sem jamais voltar a se debruçar sobre essa riqueza chamada Bernanos no Brasil. O grande urso em Barbacena precisou de um escritor francês que cruzasse o Atlântico para levantar-lhe do túmulo a que fora condenado pelos bem-pensantes de nossas Academias, e nos mostrasse o ouro que deixamos escondido em uma pequena cidade de Minas Gerais e em arquivos esparsos pelo país, fora a quase espartana casa pequenina da Cruz da Almas a que a memória dele dedicamos como mini-museu (e vez por outro abandonado, ao longo desses mais de 60 anos).
A história da inteligência no Brasil tem curtíssima memória – eis ao quê mais serve demonstrado na didática publicação de Lapaque – e a quem ficamos devedores para sempre…

Capa de “Bernanos no Brasil”, organizado por Humbert Sarrazin e nunca reeditado pela Vozes (original de 1968).

Originais de Bernanos, retirados da obra de Daniel Perezil, Cahiers de Monsieur Ouine.
Opesquisador da obra de Bernanos há-de se debruçar nos volumes antigos da Biblioteca Nacional para recuperar-lhe os artigos que duas vezes por semana
(diz-nos Lapaque na p.120 de “Sob o Sol…” edição francesa da Grasset) publicou o escritor francês, assim anunciado em “O Diário”, no dia 21 de maio de 1940 como “UN ANCIEN COMBATANT s’exprime sur l’offensive allemande” (Um ex-combatente [da I Guerra Mundial] fala sobre a ofensiva alemã n’O Diário):

Bernanos em foco com Lapaque (2003) e Sarrazin (1968) – a figura do mais brasileiro dos escritores católicos franceses ganha novas leituras
“L’écrivain français Georges Bernanos est à nouveau à Belo Horizonte, ayant pour destination Pirapora, où il réside, et d’où il reviendra peut-être bientôt, pour habiter une propriété rurale proche de Belo Horizonte”
(O escritor francês G.Bernanos está novamente em BH, em direção a Pirapora, onde reside e de onde deverá retornar em breve, para morar em uma propriedade rural perto de BH).

A casinha pequenina de Cruz das Almas guarda o que restou da memória de Bernanos no Brasil. Um pequeno recanto onde o escritor francês sonhou reproduzir um pedacinho da França no Brasil. Na sequência, um presente aos amantes da obra do “Grande Urso”, páginas esparsas de “Cahiers de M. Ouine”, de D.Pérezil
Reproduzo aqui um texto retirado do site da Academia Brasileira de Letras sobre a amizade de Virgílio e Afonso Arinos com o escritor GB na visão de Afonso Arinos Filho.
******Clique sobre o texto em destaque para acessar o arquivo em PDF: Bernanos_Virgilio_AfonsoArinos
Sobre “Monsieur Ouine”, de Georges Bernanos : Lapaque, Asensio & Cadernos de JLK…be
ENQUANTO me preparo para escrever uma resenha do livro “Sob o Sol do Exílio¨ de S. LAPAQUE, vou lendo e relendo aqui e ali sobre G. Bernanos.
Boas surpresas ao leitor na 1a. ou enésima leitura…
O livro de Sébastien Lapaque, recém-lançado pela É Realizações, em português, eu o tenho lido em francês, na edição da Grasset, recebido em 2009 como presente de correspondentes en France (Merci à Marion & Sylvain).
Muito interessante a parte em que Lapaque trata de “Monsieur Ouine” (p.105 a 118 da edição francesa). As referências de Lapaque são consistentes e contribuem com a compreensão da obra bernanosiana, levando o leitor a buscar mais informações sobre a gestação do romance (confusão nas primeiras edições, má-recepção pela Crítica, recuperação diante do público e, finalmente, a paixão como romance de experiência e de afirmação da voz final do romancista).
“Ouine” – literalmente “Sim-Não” (Oui, Ne [pas]) foi originalmente intitulado “La Paroisse Morte” (A Paróquia morta), título que GB trocou num período que vai da primavera de 1936 (quando iniciou a escrita) até maio de 1940, quando o escritor envia (de Barbacena) a Maurice Bourdel, seu editor em Paris o Capítulo XIX do que ele próprio intitulara como o livro que representa(ria) seu “maior esforço como romancista“.
E foi em Minas Gerais que Bernanos colocou o ponto final no que Lapaque chama do livro que contém a “teologia bernanosiana da noite“. Outros tinteiros já se tinham esvaziado com as tintas negras mas não da parte de um católico. Seus irmãos da noite – como quer Lapaque (ou das tinta noturna – frères d’encre) agnósticos (ou ateus) saudaram Monsieur Ouine com entusiasmo de leitores que se identificaram com o livro – Céline, Simenon e A. Artaud.
Este último teria dito:
“Je ne sais pas si je suis pour vous un réprouvé, mais en tout cas, vous êtes pour moi un frère en désolante lucidité.”
(Antonin Artaud)
No livro “Cadernos de Monsieur Ouine” (Edit. Seuil), do Monsenhor Daniel Pézeril, Lapaque diz que o leitor tem a oportunidade de viver uma experiência interessante: como que lançar um olhar, espiando sobre o ombro do escritor em pleno interior das Minas Gerais (Pirapora ou Barbacena – fiquei em dúvida – checar onde estava GB em 1943/46?!), onde num caderno colegial barato, com a bandeira brasileira na capa, sob a divisa do “Ordem e Progresso”, o nosso francês errante colocava palavra-a-palavra, avançava linha-a-linha num esforço de meia-página por dia no que para o escritor seria seu maior esforço e seu mais trabalhoso romance à la (Georges) Simenon.
O que lhe sai ao final o mais Bernanos de sua ficção. Onde a voz de Bernanos mais se faz sentir, faz-se ouvida, não obstante a primeira reação negativa.

Capa da edição incompleta (sem o 19o. cap.) do romance Monsieur Ouine, Plon, 1946. A 1a. edição da Ed. Atlântica (Rio, 1943) quase condenou o romance ao desprezo dos leitores e da crítica por ter sido publicada incompleta, cheia de lacunas e gralhas… Somente em 1951, graças a Albert Béguin, editor-amigo de GB, o romance ganhou sua versão definitiva e que ainda encanta leitores e críticos.
Sobre G Bernanos : no blog Carnets de JLK. ref. a Juan Asensio.
Leia trechos do livro de Sébastien Lapaque, no site da É Realizações.
+++++
Fonte principal – LAPAQUE, Sébastien. Sous Le Soleil de L’Exil : Georges Bernanos au Brésil 1938-1945. Paris, Bernard Grasset, 2003, 227 pp. Outras fontes cit. por links ou figuras. Todos os direitos reservados (c) Grasset, Plon, JLK, Asensio, Lapaque.
Meu amigo-virtual (um irmão bernanosiano, mais preparado e mais lido), o polemista Juan Asensio escreveu e JLK transcreveu e comentou o que chama de “salamalec” à Asensio… Preguiça de traduzir por ora… quem sabe mais tarde, ao longo do feriadão?!
“Il faut lire et relire Monsieur Ouineaujourd’hui, comme on lira bientôt La Route de Cormac McCarthy, sans se demander si nos contemporains sont encore « dignes » de ce livre et qui le comprendra. Juan Asensio insiste sur l’ « apophatisme bernanosien » comme si le roman ressortissait essentiellement à une théologie négative, sans souligner assez, me semble-t-il, l’affirmation christique secrète et traversante de ce livre, qui recrache le tiède pour mieux figurer les avatars inattendus voire infinitésimaux de l’Amour. Monsieur Ouine, dans l’interprétation d’un René Girard, pourrait être dit le roman de la médiation interne portée à son point extrême, comme il en va des romans de Dostoïevski. Comme celui-ci, mais par une voie plus droite, Bernanos dépasse la tentation du désespoir et mime la sortie du cercle vicieux, comme « par défaut ». L’esprit d’enfance, au sens évangélique, irradie le tréfonds de ce livre glauque et même sale, alors même que cette souillure apparente échappe à la damnation réelle du froid et du non-être – ce que Juan Asensio décrit justement : « Le Mal c’est le froid, le Mal c’est le néant, le Mal n’est rien d’autre, finalement, que l’ennui, ce dernier parvenu à son plus idoine état de desséchement »…” (Do blog http://carnetsdejlk.hautetfort.com/bernanos/).
Juan Asensio. La littérature à contre-nuit. Sulliver, 2007.
Bernanos, Lapaque e a Saudade
Tradução livre (forma de dizer que não é profissional), da citação à entrevista de Sébastien Lapaque. Tem a ver com o que citei antes sobre o sentido do termo Saudade segundo Lapaque.
Après le desengano, la désillusion éducatrice familière aux apprentissages portugais, ce retour aux origines est la définition même de la saudade, mélancolie proprement lusitaine, qui est à la fois regret de ce qui n’est plus et attente de ce qui sera, manière de retour vers le futur du passé. Chez Bernanos, la saudade est la nostalgie d’un roi perdu et de la terre natale. Elle est aussi, elle est surtout ce grand sentiment de l’absence qui habite certains livres de sa période brésilienne : “Les Enfants humiliés, la Lettre aux Anglais, le Chemin de la Croix des Âmes”. Voilà pourquoi l’exil était nécessaire à Bernanos : pour continuer à aimer la France sans s’en faire une idée fausse au moment de la capitulation, de la défaite et de la honte, le romancier à eu besoin d’éprouver son absence.
Depois do desengano – a desilusão da educação familiar com o aprendizado do português, este retorno às origens é a definição própria da Saudade – esta melancolia bem lusitana, que é ao mesmo tempo arrependimento por aquilo que deixou de existir e espera pelo que pode vir a acontecer -, é uma forma de retorno ao “futuro do passado” (citação ao tempo verbal). Para Bernanos, a Saudade é a nostalgia de um rei perdido e da terra natal distante. Este é também, principalmente, o grande sentimento de ausência que povoa seus livros do período brasileiro – “Les Enfants humiliés, la Lettre aux Anglais, le Chemin de la Croix des Âmes”. Eis porque o exílio era tão necessário a Bernanos: para que ele continuasse a amar a França sem que tivesse uma falsa ideia do momento em que a França capitulou, a queda da vergonha, foi quando o romancista sentiu necessidade de provar a ausência da pátria.
O sentido do termo ‘saudade’, par Sébastien Lapaque
…Saudade Ce mot, que le Français ‘melancolie’ traduit mal, revient dans toutes les conversations, à Lisbonne, au Cap-Vert, à Belém et Goa, dans les huitains de Camões, le fado de Maria Severa Onofriana et la bossa nova de Vinícius de Moraes. Il manifeste le génie d’une civilisation où l’essentiel n’est pas de vaincre, mais de survivre. La saudade, c’est la présence de l’absence, un désir de bonheur hors du monde mêlant la tristesse de ce qui n’es déjà plus à l’attente de ce qui sera. Ainsi la définissait dom Francisco Manuel de Melo, grand poète de l’âge baroque : “La saudade est une délicate passion de l’âme, et pour cela, si subtile que nous l’éprouvons seulement de manière ambiguë, sans pouvoir bien distinguer la douleur de la satisfaction. C’est un mal qu’on aime et un bien qu’on subit.
(…) Elle est le propre des êtres de raison, en vertu de ce qui existe en nous de plus élevé; et elle est un légitime argument de l’immortalité de notre esprit, à cause de cette muette suggestion qu’elle ne cesse de nous faire intérieurement, à savoir que, en dehors de nous, il y a quelque chose de meilleur que nous-mêmes, avec lequel nous désirons nous unir.”
(Soustraites au verdict de l’Histoire, les espérances portugaises trouvèrent donc refuge dans le mythe et la saudade).+++++
Fonte: LAPAQUE, Sébastien. Sous le Soleil de L’Exil. Grasset, Paris, 2003, pág. 89/90.