Uma cabeça sem olhos e um corpo sem sepultura…

Livros, meu refúgio ou: uma cabeça sem olhos e um corpo sem sepultura                                                                                 por Adalberto de Queiroz.                                                                                                (originalmente publicado em 2006 no blog “Zadig”)

Um conselho do escritor Marcel Proust me parece o mais sensato nesta hora exata do nosso país e de nosso noticiário: afaste-se dos jornais e se ancore nos livros, para reabilitar algo como “os jornais e as coisas insignificantes” versus “os livros e as coisas essenciais“.

Há muito deixei de ver os jornais de TV – os jornais falados – estão infectados de interesses e de uma retórica gramsciana. Me irritam os jornais. A realidade que lêem para os analfabetos é um prato de propaganda do lulismo, do agnosticismo, da república sindical que se instalou entre nós e da ausência de valores, da tristeza que nos circunda.
E a angústia, olhando para os livros tem outra cara?
– “A angústia é uma cabeça sem olhos.”

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Eis a realidade do nosso país, e de outros ao redor do mundo; realidade que os jornais são incapazes de decifrar.

Lembrai-vos, leitores de jornais, há algum tempo atrás um outro menino jogava a cabeça decepada de um colega por sobre o muro, mas não há suite dos fatos e das interpretações.

Qual é o sacrifício possível numa realidade sem interpretação como esta?
Qual sacrifício aceitável entre nós, brasileiros, exaustos mas incapazes de reação?
Todas as reações foram elegíveis ao supremo altar da representação – o parlamento, inundado de interesses mas ainda menos podre que o reino – a coorte neo-marxista que se exime do dever de solução posto que suprema coorte representando os próprios executores. Dormir com tal ruído, quem há-de?

Que o sacrifício deste pequeno menino carioca seja examinado sob a luz do “acidente de trabalho” de pequenos malfeitores, assaltantes (estes falsos moedeiros) escondidos em pele do cordeiro (da legislação) na caverna do monstro Ciclope (Ulisses às avessas…). Eles não foram capazes de apagar as pistas sobre o asfalto ensangüentado, não se deram conta da violência que cometeram?

Provavelmente, é comum tal intensidade de violência no meio dos pequenos delinquentes sem pena (quem sabe?).
E quem sabe o que se seguirá a essa violência do Rio, quando a Igreja e o Executivo dizem que não há correção – e os magistrados se calam ou torcem a Lei – se negando a admitir ou a exercer de fato o castigo sobre os violentos e assassinos, independentemente de suas idades…

Desde que se acende em um reino ou em uma república este fogo violento e impetuoso, vemos os magistrados aturdidos, as populações apavoradas, o governo desarticulado. A justiça não é mais obedecida; os trabalhos param; as famílias perdem sua coesão, e as ruas sua animação. Tudo se reduz à extrema confusão. Tudo cai em ruínas. Com efeito, tudo é atingido e abalado pelo peso e pela grandeza de uma calamidade tão horrível. As pessoas, sem distinção de estado ou de de fortuna, são afogadas por uma tristeza mortal…Aqueles que ontem enterravam, hoje são enterrados…  Recusa-se qualquer piedade pelos amigos, pois toda piedade é perigosa…

“Todas as leis do amor e da natureza se encontram afogadas ou esquecidas no meio dos horrores de tão grande confusão, as crianças são repentinamente separadas de seus pais, as mulheres dos maridos, os irmãos ou os amigos uns dos outros… Os homens perdem sua coragem natural e, não sabendo mais qual conselho seguir, caminham como cegos desesperados que se obstinam a cada passo em seu medo e em suas contradições.” (1)

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(1) Francisco de Santa Maria, “História de sagradas congregações”, Lisboa, 1697, citado por René GIRARD,  “O Bode Expiatório”, p.20.

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