Amor, Love, Valentine’s Day

A AMÉRICA intitulou-os “Poems by occasions“. Eles existem em profusão e não estão no meu radar de leitor. A Poesia me basta pelo universo paralelo que engendra…pois creio que “ermas de melodia e conceito/elas se refugiaram na noite, as palavras.

O poeta maior da língua portuguesa no séc. xx – CDA – aconselhava a não fazer versos sobre acontecimentos; mas vamos lá uma só concessão ao coração dos que amam ou desejam ser amados.

“Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.”

Portanto, façamos aqui uma pausa crítica,
para Valentine’s Day e poemas de amor e de anti-amor.valentine-feature-1

Primeiro, um poema de John Donne “Definição de Amor”, na tradução de Aíla de Oliveira Gomes. Depois, algo mais de Poesia Metafísica, que já citei outrora, sem data especial nem nada, só pela beleza e qualidade da poesia.image

+Dois Poemas de Poesia Metafísica*

1) John Donne – Preleção sobre a Sombra

Espera, que uma preleção eu vou te ler,
Amor, sobre o amor e sua filosofia.
Nessas três horas de nosso lazer,
Aqui vagando, um par nos precedia
De sombras, que eram por nós mesmos projetadas;
Ora o sol está a pino sobre nós, tu vês,
E nossas sombras, sob nossos pés;
E tudo se reduz à brava claridade.
Assim, ao que nosso amor infante crescia,
Nossas sombras, o nosso disfarce, sumia
De nós e nossos medos; mas avança o dia.

Nenhum amor atinge o seu mais alto grau
Enquanto a vista alheia teme, como um mal.

A menos que o amor no zênite haja parado,
Produziremos novas sombras do outro lado.
Se as primeiras servem a nos ocultar,
Aos outros cegando; estas, a atuar
Atrás de nós, é qual a nós mesmos cegar.
Se nosso amor definha e declina  no poente.
Tu a mim e eu a ti, falsamente,
Nossas ações deixamos se disfarcem
Entre nós. As sombras da manhã se desfazem;
Estas crescem sempre mais, todavia,
Pois, ai! se o amor se esvai, curto é o dia.

O amor é uma luz sempre crescente e constante;
Seu primeiro minuto após meio-dia é noite.

2) Henry Vaughan – Instante – slide abaixo.

INSTANTE, poema de Henry Vaughan
Instante – poema de Henry Vaughan, trad. Aíla de Oliveira Gomes.

ΨΩΨ
FONTE: Poesia Metafísica / William Shakespeare…[et alli]; seleção, tradução, introdução e notas de Aíla de Oliveira Gomes. – S. Paulo: Companhia das Letras, 1991.

Crédito da Ilustr. imagem destacada: Raphael (Raffaello Santi), school of. 1483-1520.“Venus and Adonis”, Hermitage Museum. Mas sobre Valentine’s Day e a Poesia no link de Poetry Foundation.

Poesia Metafísica (3)

John Donne

(c) genius.com

DIFÍCIL DIZER ALGO RELEVANTE, agora,
neste século em que o mundo se mostra às avessas,
de ponta-cabeça; difícil quando o que temos é apenas…

“um….mundo
Fora dos eixos,
como de nascença, manco…”

QUANDO o amigo te anuncia solene o veredicto dos ‘especialistas’:

“Não publique versos, principalmente não os publique em linhas destacadas, i.e., versos alinhados como versos foram compostos, paridos, suados, tirados à fórceps da idéia do poeta…que os tirou de alhures, do éter, do Todo…
É como se anunciasse a morte de Elizabeth Drury ou de Laura, a Donne ou a Petrarca. Penso:

“….o corpo é nada, morto o coração,
A não ser que te nutras (banquetear-te, não!)
Do alimento transcendente – a Religião.”

As pessoas não lêem. Não se interessam por versos… E, afinal, todos queremos ser lidos, todos queremos audiência.
Um dos males do século é a audiência. O desejo dela. A ausência.
O inopinado desejo de possui-la, mesmo que ao preço do estupro mental.
Se cresces assim, à caça de tal público…segreda-me Elizabeth:

“….Por mais que cresças, cresces apoucado e seco.”

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Poesia Metafísica (3)

John Donne

(c) genius.com

DIFÍCIL DIZER ALGO RELEVANTE, agora,
neste século em que o mundo se mostra às avessas,
de ponta-cabeça; difícil quando o que temos é apenas…

“um….mundo
Fora dos eixos,
como de nascença, manco…”

QUANDO o amigo te anuncia solene o veredicto dos ‘especialistas’:

“Não publique versos, principalmente não os publique em linhas destacadas, i.e., versos alinhados como versos foram compostos, paridos, suados, tirados à fórceps da idéia do poeta…que os tirou de alhures, do éter, do Todo…
É como se anunciasse a morte de Elizabeth Drury ou de Laura, a Donne ou a Petrarca. Penso:

“….o corpo é nada, morto o coração,
A não ser que te nutras (banquetear-te, não!)
Do alimento transcendente – a Religião.”

As pessoas não lêem. Não se interessam por versos… E, afinal, todos queremos ser lidos, todos queremos audiência.
Um dos males do século é a audiência. O desejo dela. A ausência.
O inopinado desejo de possui-la, mesmo que ao preço do estupro mental.
Se cresces assim, à caça de tal público…segreda-me Elizabeth:

“….Por mais que cresças, cresces apoucado e seco.”

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