[Ou: “O travo agridoce da Saudade.]
J.G. MERQUIOR escreveu, em maio de 1978,
aquele que considero o prefácio definitivo
e, naturalmente, com um título tipicamente merquioriano:
“Notas para uma Muriloscopia“.
Ninguém melhor do que J. Guilherme poderia ter uma visão tão aguçada sobre a poesia de MM (1901-1975).
E se o leitor perguntar-se: porque a mensagem de Murilo Mendes, baseada num catolicismo não militante, traz uma mensagem única e até hoje válida num mundo ?
– “…No legado do cristianismo uma mensagem tão ou mais pertinente ao nosso tempo social de que à época de Jesus de Nazaré.
Ou: porque “o sentimento básico do poeta Murilo Mendes era [é], segundo Merquior: “…no seio mesmo da sua consciência da finitude do mundo criatural, antes a vibração da esperança, a crença… na regeneração do ser.”
MURILOSCOPIA (c)J.G. Merquior
“NA CONSCIÊNCIA do público e da crítica de poesia, a imagem da obra ímpar de Murilo Mendes parece ter passado de tangente a eixo da nossa tradição moderna. Longamente considerado voz solitária e insólita, o poeta figura hoje, e com toda a razão, entre os tetrarcas da lírica modernista. Qual o sentido dessa inusitada parábola na recepção de Murilo? Quais as linhas de força que, na sua produção poética, se responsabilizam por ela?
“Creio que o segredo se prende à própria natureza do modernismo. Como estilo compósito, próprio à primeira fase da nossa ‘modernização’, isto é, a esta transição social que ainda estamos vivendo (e em muitos pontos, sofrendo), o modernismo brasileiro foi um estilo híbrido e heterogêneo, feito da convivência ou fricção de estilemas tipicamente ‘arte moderna’ com vários traços a rigor bem pré-modernos (porque prolongamentos de formações artísticas anteriores) e, no entanto, dotados (como se vê em Cecília, Schmidt, Cornélio Pena) de inegável poder adaptativo e funcionalidade estética. Por isso mesmo é que nosso modernismo literário seria, ainda mais que o plástico, e sem dúvida bem mais que o musical, um complexo estilístico. Não foi por acaso que só pôde ter a unidade de um movimento, jamais a uniformidade de uma escola.